Empresa de vídeo jogos em incubação virtual admite estabelecer-se nos Açores

Comecemos pela história da vossa empresa. Quando foi criada e qual o seu propósito?
Esta aventura começou em 2005, quando eu, o meu irmão e outra pessoa, estávamos a trabalhar em áreas que nada tinham a ver com jogos. Eu trabalhava na banca em consultoria informática, mas sempre tivemos aquele interesse e aquele ‘bichinho’ pelos jogos. Em 2006 houve uma competição de vídeo jogos, em Portalegre, enviamos para lá um projecto que acabou por ser vencedor. A partir daí começamos a pensar que realmente poderíamos começar a fazer jogos de uma forma profissional. Entretanto criamos a nossa primeira empresa, que acabaria por fechar. Em 2009 abrimos a nossa segunda empresa nos Estados Unidos da América (EUA) e agora, em 2020, resolvemos abrir em Portugal a mesma empresa. Estamos presentes nos Açores e nos EUA. Já contamos com alguns anos de experiência e fazemos jogos para PC e para consolas. Estamos focados num nicho de jogos de terror/assustadores e estamos a crescer aos poucos.

Quantas pessoas trabalham na empresa?
A equipa base da empresa somos só nos dois (Ricardo e Bruno Cesteiro) mas depois em cada projecto que desenvolvemos crescemos a equipa conforme vamos precisando. Somos os dois programadores informáticos e seguimos um percurso muito semelhante. Estudamos ambos na mesma faculdade e começamos a trabalhar em programação na banca, o que não era nada estimulante e não era o que queríamos.

Foi sempre isto que quis fazer?
Na verdade não. Eu comecei a mexer em computadores e a ter acesso a jogos muito cedo, devia ter 6 ou 7 anos. Cresci muito com esta ligação aos jogos, mas naquela altura nunca sonhei que pudesse vir a fazer jogos. Era muito complicado e não era fácil aceder sequer a informação ou a tecnologia relacionada com vídeo jogos. Só mais tarde, na idade adulta e com o aparecimento da internet e de ferramentas que já facilitavam a criação de vídeo jogos é que comecei a perceber que era possível e que podia entrar neste mundo. Inicialmente começamos por hóbi e depois atiramo-nos de cabeça. Quando era mais novo nunca sonhei que acabasse a fazer uma coisa de que gostava tanto.

Este sector da criação de jogos tem muita concorrência?
Sim. Naquela altura em que essas ferramentas e informação começaram a ficar mais acessíveis, ficaram-no para toda a gente. Começaram a aparecer muitas equipas e muitos jogos e, hoje em dia, se queremos que um jogo venda bem e que as pessoas o conheçam temos de ‘nadar’ por um mar de concorrência. Existem muitas e boas equipas espalhadas pelo mundo inteiro e todas as semanas, ou mesmo todos os dias, são lançados imensos jogos.

O que é preciso para estar na linha da frente nesta área? O que define um bom vídeo jogo?
Isso é a questão de 1 milhão de dólares. Acima de tudo o jogo tem de ter algo de único e que chame a atenção, porque as pessoas estão fartas de jogar jogos que são iguais uns aos outros. Tem de ter algo que nunca se viu ou pelo menos que tente inovar de alguma forma. Tem de ter boa jogabilidade para prender o jogador, bons gráficos, bom som, não pode vir com bugs (falhas) e depois disso, para além de ser um bom jogo, temos de conseguir levá-lo às pessoas. É preciso apostar muito em marketing e na divulgação. Isso tem de começar a ser feito antes de montar o jogo. Muitas vezes começamos a apresentar o jogo e a mostrar imagens, um ano antes de lançar o jogo, para quando chegar o dia do lançamento já exista muita gente interessada. Infelizmente há muita gente que não faz esse marketing e que se foca apenas no jogo que até é bom, mas que não vende porque as pessoas não o conhecem.

Qual o investimento necessário para se lançar um jogo no mercado?  
Depende um pouco da escala do projecto e do estilo de jogo. Mas diria que, para construir um jogo de uma qualidade média e que se venda bem, é necessário um valor acima dos 150 mil euros.

Quanto tempo é necessário para concluir um projecto destes?
Tentamos não ultrapassar a meta dos dois anos. Muitas vezes acaba por ultrapassar um pouco e o nosso último jogo, por exemplo, levou 3 anos a fazer. Saiu em PC, depois em consola e necessitou de mais desenvolvimento.

Qual a razão que vos levou a instalarem-se no Terinov?
Já tínhamos a nossa empresa aberta na Califórnia e queríamos abrir em Portugal. Andávamos a estudar onde o iríamos fazer e entretanto tenho um amigo que vive na ilha Terceira e que está instalado no Terinov. Ele disse-nos que o Terinov estava interessado em receberem empresas novas ligadas às tecnologias e ao gaming. Estive no Parque uma semana para conhecer, gostei muito do que tinham para nos oferecer e partir daí foi uma decisão fácil de tomar.

Vocês estão instalados virtualmente no Terinov?
Exactamente. Por enquanto estamos de forma virtual, mas ainda não sabemos como será no futuro e existe até a possibilidade de colocarmos pessoas fisicamente no Terinov. Estamos ainda a estudar isso.    

Os Açores podem desempenhar um papel importante no apoio a empresas deste género?
Penso que sim e tem todos os elementos para que isso aconteça. Até do ponto de vista geográfico estão muito bem localizados e havendo este tipo de parques tecnológicos e de iniciativas para ajudarem as empresas a crescer, acho que tem muito potencial para que se possa criar uma espécie de pólo relacionado com tecnologia. Gostava muito de ver e espero que isso venha a acontecer.

Onde vocês se inspiram para a criação de um vídeo jogo?
Desde há uns anos que o nosso foco tem estado direccionado para os jogos de terror e experiências assustadoras. Eu sou um grande fã de filmes e de histórias de terror. Vejo muitos filmes e leio muitos livros e quando o faço estou a tomar notas. Também vejo outros jogos do género, mas a grande inspiração são os filmes e os livros. Não é feita nenhuma pesquisa específica e é algo que vai acontecendo. Quando chega o momento de começar a trabalhar num novo jogo já temos várias ideias para discutir e mais tarde decidir qual será a mais interessante para começar a desenvolver.

Existem algumas críticas afirmando que estes jogos incitam à violência. Concorda com esta visão? Vocês colocam algum limite para a violência apresentada nos vossos jogos?
Não concordo nada com essa visão. Existem algumas pessoas que começaram a dizer que os jogos aumentavam a violência nos jovens, mas depois vemos filmes, séries e desenhos animados com cenas de violência extrema e nesses casos já não se aplica a mesma regra? Inclusivamente no contexto que vivemos devido à pandemia, penso que até foi a Organização Mundial de Saúde que disse que os vídeo jogos ajudam muito os jovens a ultrapassar esta fase. Dá-me a ideia que se anda um pouco a saltar entre dizer que os jogos são maus e são bons para as crianças e para o seu desenvolvimento. No nosso caso não utilizamos violência gratuita, como cenas de violações por exemplo. Temos jogos em que existem tiros ou combates e existem pessoas que morrem, mas não andamos a explorar o acto da violência em si, mas como algo inserido numa luta. Penso que esses ataques feitos especificamente aos vídeo jogos são muito injustos.

Presentemente em que é que estão a trabalhar?
Lançamos o nosso último jogo em Maio do ano passado e entretanto já começamos a trabalhar no próximo que será do mesmo género. Não posso avançar muita informação mas é um jogo que vai sair para PC, Playstastion e Xbox. Estamos a apontar o seu lançamento para 2022.

O que gostavam de alcançar e como gostavam de ser conhecidos neste meio?
Gostávamos de crescer um pouco a equipa. Não em demasia porque não aspiramos ter uma equipa muito grande, mas gostávamos de conseguir fazer as coisas de uma forma mais rápida. Gostávamos de conquistar o nosso espaço dentro deste nicho para que quando ouvissem o nosso nome reconhecessem aquilo que fazemos e que a nossa marca fique associada a bons jogos.    
                                             

Texto: Luís Lobão

Foto: Correio dos Açores